Sobre Das Coisas Quebradas

Entrevista de Lucas Bambozzi a Giselle Beiguelman a respeito da participação de DAS COISAS QUEBRADAS na exposição Tecnofagias – Mostra 3M de Arte Digital (agosto/setembro de 2012)

Giselle Beiguelman: Como você relaciona a obra que expõe na Mostra Tecnofagias com o conjunto da sua obra? (Você diria que ela dá continuidade a questões presentes em outros projetos? Quais? Ou esse é um projeto particu- lar ou que marca uma novo direcionamento em seu trabalho?)

Lucas Bambozzi: O projeto “Das Coisas Quebradas”, é de fato a continuidade de um ou mais projetos anteriores – sendo um deles a instalação Mobile Crash (2010 – que obteve menção honrosa no Ars Electronica 2010). Executar o desdobramento dos trabalhos que o antecedem é uma oportunidade de aprofundar em tecnologias e questões que permeiam um percurso anterior — e são exemplares as curadorias que não apenas dão atenção a esse processo mas disparam novas possibilidades.

Me parece que alguns projetos demandam essa continuidade, como se não se resolvessem em uma única proposta. E acho também que, revendo um certo percurso, vejo que não persigo muitos temas, havendo um alinhamento de meus projetos entre uma meia dúzia de questões, que continuam a se renovar, em função das mídias que se en- trecruzam, dos ‘memes’ que se contaminam, da Internet que sai pra fora da rede e nos impacta em outros âmbitos. Mas também em função de uma necessidade pessoal de revisitação de questões, a partir de um amadurecimento diante dos temas. Algumas dessas questões são reincidentes e suas possíveis palavras-chave seriam: intimidade, sociabilidade, mediação, vigilância, controle, privacidade, precariedade, obsolescência, baixa resolução, engenharia reversa,

GB: A mostra deste ano tem como tema Tecnofagias; Ciência de Ponta/ Ciência de Garagem. Como você se posiciona em relação a essa abordagem? Como vê o seu trabalho nessa perspectiva?

LB: Poderia dizer que essa abordagem se cruza com alguns dos temas mencionados [pergunta anterior] que venho perseguindo, ou sendo vítima, de tempos em tempos. Na ambivalência entre ciência de ponta e ciência de garagem, sempre me afinei mais com as perspectivas de quem está dentro da garagem. Em tempos de euforia diante dos vídeos da alta resolução, permaneci buscando as estéticas associadas à baixa resolução. Diante das expectativa de alargamento das bandas de internet, segui buscando formas de uso das conexões mais lentas, em formas que demandariam menor tráfego. Diante do cinema 4k venho ainda acreditando na profusão de telas pequenas ou na redistribuição das bandas em canais que representem maior número de produtores.

Dentre outras intersecções que me ocorrem, entre o tema e minhas próprias conexões, lembro que em 2005 fui um dos organizadores do festival Digitofagia (http://digitofagia.midiatatica.info/), que propunha colocar foco na emergência desse contexto. Como dizia na época o saudoso pesquisador e tecnólogo autodidata, Ricardo Rosas (mentor do Digitofagia) as práticas endêmicas no Brasil incluem a precariedade, a gambiarra e a apropriação tecnológica.

Se até então Ricardo reclamava não haver uma teoria que contemplasse tais práxis, o tema Tecnofagias endossa o corpo de um pensamento hoje mais visível, que continua a crescer em pertinência.

GB: Com relação ao Brasil, você se definiria como um artista brasileiro, porque nasceu e/ou desenvolve seu trabalho no Brasil, ou porque identifica alguma característica em seu trabalho que o particulariza como tal? (Seja qual for sua resposta, esclareça sua posição).

LB: Sou brasileiro a ver o mundo dessa perspectiva peculiar, meio enviesada e meio de esguelha, precária às vezes, em vários aspectos. Não busco essa condição por estratégia, nem acho que há arquétipos desta natureza no que faço. Mas a sensação de estar à margem me é familiar, está de fato presente, independente das teorias. E já ficou muito atrás o tempo em que evitava tal caracterização.

Por outro lado, cheguei a iniciar trabalhos fora do país que a princípio não tinham uma relação com uma condição associada o Brasil. Mas em algum momento as abordagens acabam se aproximando, tendo temas ou estéticas como atratores. Ou se aproximam os contextos, tendo em vista os deslocamentos culturais ou os efeitos da globalização.

 

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