Multidão 4 . 2013

multidao vinheta imagem

Duas projeções, frente-a-frente, de grandes proporções, com imagens de duas multidões. As imagens dessa multidão, gravada com cerca de 150 pessoas no Vale do Anhangabaú (cerca de 1 hora antes da projeção) se confrontam com imagens de outra multidão, previamente gravada. 

multidao projetada virada

Nessa situação de espelhamento do fluxo de pessoas durante a Virada Cultural, as duas paredes inferiores do Viaduto do Chá formam as telas para a projeção, utilizadas como forma de criar um “confronto” entre duas multidões diferentes. Uma turma com alguns dizeres e cartazes, outra com mais passiva. A ideia da ação não estimula o confronto, mas torna impossível ignorá-los, na perspectiva de enxergarmos o encontro possível entre as duas situações.

O projeto é uma nova versão de um trabalho realizado inicialmente para a fachada de vidro do Sesc Pinheiros, em 2006, onde um grupo de pessoas se vê intimidado a seguir adiante, por algum motive desconhecido.

A cena criada para a Virada é o retrato de um embate entre duas ‘turmas’, facções, manifestantes. Seria talvez a constatação da diferença percebida numa multidão. Nao é uma repetição da cena original, nem exatamente um confronto com o visitante como a cena realizada na Favela da Mare (exposição Travessias 2, 2013), e tampouco a ideia de pose típica de mural, como foi na Cidade do Mexico (2011), mas uma representação do desentendimento que muitas vezes vemos entre grupos — que no fundo, almejam coisas muito parecidas.

Descrição da ação:

Vemos que podemos formar uma multidão. Somos muitos, talvez umas 150 pessoas ou mais. Temos em nossa maioria, entre 20 e 40 anos, mas vemos pessoas de várias idades à nossa volta, há crianças e idosos. 

Vamos nos encontrando e vemos que temos afinidades com outros que não conhecemos. Cumprimentamos os que estão mais próximos. Alguns carregam cartazes, faixas. Parecem que preparam uma manifestação, ou algo que não sabemos ainda do que se trata. Aos poucos outros se juntam. Há uma certa cordialidade entre todos. Estamos entre nós.

Logo alguns percebem que à nossa frente um grupo parecido se aproxima. Observamos com atenção como eles/elas se aproximam. Podem ser amigos, “da nossa turma” talvez nem tanto. Olhamos todos fixamente para eles. Buscamos a atenção deles, ainda sem saber do que se trata. Aos poucos, alguns de nós procura contato. Percebemos que são mesmo “boa gente”.

Chamamos essa multidão à nossa frente para se juntarem a nós. Queremos ser muitos, queremos ser um grupo ainda maior. Acenamos para os que estão à nossa frente. Mostramos nossas mensagens, escritas em cartazes e esperamos um pouco a reação deles/delas. Insistimos nessa tentativa.

Mas percebemos aos poucos que eles/elas não estão se interessando em se juntar a nós. Parece que não nos entendem. Nós continuamos tentando a aproximação. Mas vemos que eles se viram e parecem ir embora. Ficamos ali parados, e aos poucos voltamos aos nossos grupos menores, e também vamos embora.

descrição da ação para os participantes – distribuída no local da gravação

 

 

Estudos para a projeção:

julio prestes mulltidao estudo

montagem paineis final

parede viaduto cha copy

 

Documentação em Vídeo de Multidão na Virada Cultural Paulista

Outros desdobramentos:

conversa com Natacha Rena e Barbara Szanieck, dias antes de deflagradas aas manifestações do MPL, pela revogação do aumento da tarifa do transporte público, em todo o Brasil:

(…) tive um retorno dos participantes com relação ao sentimento, inédito para a maioria, de pertencer a essa força coletiva, que muitos não conheciam.

Falo de pessoas que nao participariam de uma passeata, nao engrossariam manifestações (talvez frequentem algum igreja). Entao percebem essa potência da multidao ali, ombro a ombro, como numa pintura mural (meu projeto partiu da pintura It Cuarto Stato de Giuseppe Pellizza da Volpedo). (…) ao se fazendo representar, essa multidão passa a ter consciência não apenas dessa representação (…) mas de algo que pode estar além. Ao se verem ali (…) compartilham algo mais, há um encontro entre ‘o que vem de dentro e o que vem de fora’, algo que é buscado na religião, no anseio de alguma ordem/revelação superior (sic), (talvez seja o que freud chamaria de sentimento oceânico, em O Mal Estar da Civilização). Em algum momento é possível acreditar que essa instancia ‘superior’ (uma ‘causa’ – passa a existir entre os participantes dessa situação, entre um ombro e outro (a pintura mural e política do Mexico por exemplo) e isso já não é mais uma simples cena, pois torna-se (…) catártica, (mesmo não sendo uma procissão de corpus christi ou um show do padre marcelo).

Um dia (…) ao invés de uma encenação, tomaríamos uma rua, um prédio, uma praça, ou algo mais… Pois as pessoas teriam a consciência de que podem fazê-lo.

Jasmina Tesanovic, me perguntou ao ver as imagens dessas pequenas multidões: “Lucas, o que vc está fazendo?” Eu respondi: “treinando para uma revolução”. Brincadeira, pretensão e descabimento da minha parte, talvez. Mas para alguns, despertar essa possibilidade, mesmo no plano simbólico, é mais que um treinamento.

 

Multidão na Virada:

  • duas projeções frente a frente, de 26 metros de extensão cada uma
  • local: Vale do Anhangabaú, sob o Viaduto do Chá
  • de 18 a 19 de maio, Virada Cultural
  • produção: Larissa Alves e Luciana Tognon
  • câmera: Gabriel Bitar
  • apoio: Visualfarm
  • realização: Diphusa Mídia Digital e Arte Ltda
  • parceria: Labmovel

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